quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Da vontade política ao combate efectivo da corrupção

 Um ponto prévio faz-me recordar que o discurso ‘’vibrante’’ sobre a corrupção que foi emitido pelo Chefe de Estado aos Directores Nacionais e chefes de departamentos, surgiu na mesma semana em que decorria a reunião anual do FMI e do Banco Mundial (10.10 - 15.10), onde a corrupção foi um dos temas de destaque. Dito desta forma, é preciso estar atento ao 'timing político' e o alcance que se pretendia atingir em Moçambique e não só. Nessa reunião anual, a Directora-Geral do FMI, Christine Lagarde, disse que: ‘’(...) O combate à pobreza não deve ser a prioridade primária, mas sim a corrupção, é ela que cria a pobreza e não o contrário...’’. É verdade que esse argumento pode ser rebatido e contestado, mas deixemos essa análise para uma outra ocasião. Porém, também é verdade que como país passamos os últimos anos a dizer que devíamos combater a pobreza (absoluta) e os números mostram que não só aumentamos essa mesma pobreza, mas a corrupção também.


Para começar, é preciso recordar que uma das referências quando falamos de vontade política é Frantz Fanon (escritor e psiquiátrico) nas suas incursões sobre o 'voluntarismo'. Para Fanon, devem existir três condições para a materialização da vontade política: (1) entusiasmo ou rebelião "espontânea", bem como uma mobilização organizada – acção coordenada; (2) respeito pelo colectivo, em detrimento de um grupo cujos privilégios ou interesses estão acima de um todo e (3) superar a resistência daqueles que se opõem às mudanças impostas pela vontade política, os inimigos do povo.

Decidi trazer a abordagem de Fanon que embora tenha sido aplicada num contexto em que a luta era outra, a mesma nos ajuda a analisar de que forma estaremos a ter um discurso político sobre a corrupção que nos permita alcançar os objectivos que pretendemos. Assim, a resistência à mudança daqueles que estão habituados a viver no 'berço da corrupção' mostra-se como a primeira barreira de combate. Aliás, Fanon nos mostra que a forma como nos organizamos para materializar uma vontade política deve depender daqueles que nos rodeiam, mas também do que nos rodeia.

Por outro lado, é preciso perceber que o discurso do Presidente da República não constitui a sua vontade particular, na verdade ela constitui a vontade de ‘’todos os moçambicanos’’. Já me explico...o termo vontade política foi cunhado pela primeira vez pelo filósofo Thomas Hobbes. Para Hobbes, a vontade política só pode existir se duas condições forem satisfeitas ao mesmo tempo: (1) que cada um submeta sua vontade à de um outro que seja único e (2) que esta vontade única seja considerada como a vontade de todos.

De acordo com o filósofo, a vontade política começa com uma transferência. Eu, cidadão comum, transfiro o meu poder e a minha vontade a uma outra pessoa pública. Ao fazer essa transferência, de uma certa maneira eu renuncio o meu poder de transformação e o entrego a um receptor, um político eleito. Desta forma, por meio de sua representação, o político tem o poder de fazer qualquer acção com essa vontade. Esse poder é a autorização. Entende-se que assim ele poderá tomar qualquer atitude, em virtude da concessão de uma permissão – chamado de mandato – por parte daquele a quem pertence o direito (eleitor). Se ele fizer o melhor uso dessa autoridade, concedida por meio da representatividade, ele a utilizará em projetos de interesse da população, a fim de que seja concebida uma vontade política.

Colocadas as coisas dessa maneira, penso que há necessidade de se pensar sobre que ‘’mato pretendemos caçar o nosso alimento’’, ou seja, quais são as bases (legais, institucionais, humanas e financeiras) existentes para que esse ‘’discurso poético’’ de combate a corrupção possa vincar (?). Outrossim, precisamos nos questionar de que forma estaremos aptos a deixar ser agentes corruptores, pois, é preciso perceber lembrar que a corrupção se desenrola (também) num prisma micro onde existe o corrupto e o corruptor – devemos aprender a superar os nossos próprios vícios como sociedade.

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