Um
ponto prévio faz-me recordar que o discurso ‘’vibrante’’ sobre a
corrupção que foi emitido pelo Chefe de Estado aos Directores Nacionais e
chefes de departamentos, surgiu na mesma semana em que decorria a
reunião anual do FMI e do Banco Mundial (10.10 - 15.10), onde a
corrupção foi um dos temas de destaque. Dito desta forma, é preciso
estar atento ao 'timing político' e o alcance que se pretendia atingir
em Moçambique e não só. Nessa reunião anual, a Directora-Geral do FMI,
Christine Lagarde, disse que: ‘’(...) O combate à pobreza não deve ser a
prioridade primária, mas sim a corrupção, é ela que cria a pobreza e
não o contrário...’’. É verdade que esse argumento pode ser rebatido e
contestado, mas deixemos essa análise para uma outra ocasião. Porém,
também é verdade que como país passamos os últimos anos a dizer que
devíamos combater a pobreza (absoluta) e os números mostram que não só
aumentamos essa mesma pobreza, mas a corrupção também.
Para
começar, é preciso recordar que uma das referências quando falamos de
vontade política é Frantz Fanon (escritor e psiquiátrico) nas suas
incursões sobre o 'voluntarismo'. Para Fanon, devem existir três
condições para a materialização da vontade política: (1) entusiasmo ou
rebelião "espontânea", bem como uma mobilização organizada – acção
coordenada; (2) respeito pelo colectivo, em detrimento de um grupo cujos
privilégios ou interesses estão acima de um todo e (3) superar a
resistência daqueles que se opõem às mudanças impostas pela vontade
política, os inimigos do povo.
Decidi
trazer a abordagem de Fanon que embora tenha sido aplicada num contexto
em que a luta era outra, a mesma nos ajuda a analisar de que forma
estaremos a ter um discurso político sobre a corrupção que nos permita
alcançar os objectivos que pretendemos. Assim, a resistência à mudança
daqueles que estão habituados a viver no 'berço da corrupção' mostra-se
como a primeira barreira de combate. Aliás, Fanon nos mostra que a forma
como nos organizamos para materializar uma vontade política deve
depender daqueles que nos rodeiam, mas também do que nos rodeia.
Por
outro lado, é preciso perceber que o discurso do Presidente da
República não constitui a sua vontade particular, na verdade ela
constitui a vontade de ‘’todos os moçambicanos’’. Já me explico...o
termo vontade política foi cunhado pela primeira vez pelo filósofo
Thomas Hobbes. Para Hobbes, a vontade política só pode existir se duas
condições forem satisfeitas ao mesmo tempo: (1) que cada um submeta sua
vontade à de um outro que seja único e (2) que esta vontade única seja
considerada como a vontade de todos.
De
acordo com o filósofo, a vontade política começa com uma transferência.
Eu, cidadão comum, transfiro o meu poder e a minha vontade a uma outra
pessoa pública. Ao fazer essa transferência, de uma certa maneira eu
renuncio o meu poder de transformação e o entrego a um receptor, um
político eleito. Desta forma, por meio de sua representação, o político
tem o poder de fazer qualquer acção com essa vontade. Esse poder é a
autorização. Entende-se que assim ele poderá tomar qualquer atitude, em
virtude da concessão de uma permissão – chamado de mandato – por parte
daquele a quem pertence o direito (eleitor). Se ele fizer o melhor uso
dessa autoridade, concedida por meio da representatividade, ele a
utilizará em projetos de interesse da população, a fim de que seja
concebida uma vontade política.
Colocadas
as coisas dessa maneira, penso que há necessidade de se pensar sobre
que ‘’mato pretendemos caçar o nosso alimento’’, ou seja, quais são as
bases (legais, institucionais, humanas e financeiras) existentes para
que esse ‘’discurso poético’’ de combate a corrupção possa vincar (?).
Outrossim, precisamos nos questionar de que forma estaremos aptos a
deixar ser agentes corruptores, pois, é preciso perceber lembrar que a
corrupção se desenrola (também) num prisma micro onde existe o corrupto e
o corruptor – devemos aprender a superar os nossos próprios vícios como
sociedade.
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